A invasão napoleônica
Em dezembro de 1807, a bandeira francesa foi arvorada no Castelo de São Jorge, em Lisboa. Os portugueses tomaram, então, o real conhecimento que a nação lusa caíra “em poder das águias”. Alguns tumultos entre soldados franceses e o baixo povo registraram-se. Os últimos gritavam: “Viva Portugal e morra a França!” Começava, assim, o domínio francês em Portugal.
Foram três os momentos das intervenções das tropas de Napoleão Bonaparte em Portugal: em novembro de 1807, em março de 1809 e em agosto de 1810. Desde os primeiros conflitos entre a França e a Inglaterra, Portugal manteve uma política de neutralidade, passando a diplomacia portuguesa a oscilar entre a manutenção da tradicional aliança inglesa e a anuência às exigências da França e da Espanha. Com o decreto do Bloqueio Continental e os novos êxitos de Bonaparte contra a Prússia e Rússia (1807), alterou-se radicalmente o quadro do equilíbrio político na Europa, com o predomínio francês no continente. Criou-se a situação limite, em que as forças napoleônicas, vitoriosas a leste, podiam agora voltar suas atenções para a Península Ibérica. A questão primordial francesa era, além do fechamento dos portos portugueses à navegação britânica, a exigência de prisão dos súditos britânicos residentes em Portugal e o confisco de seus bens. Nesta difícil situação, Portugal acabou por aceitar as condições inglesas, com o projeto de transferência da Corte para o Rio de Janeiro, apoiado por estadistas lusos, como Rodrigo de Souza Coutinho.
Enquanto a família real preparava sua partida para o Brasil, na noite de 24 de novembro, as tropas aliadas franco-espanholas invadiam o território português. De início, os invasores foram recebidos pelo governo da Regência como protetores, seguindo-se, portanto, as "Instruções" dadas por D. João. Mantinha-se assim um sistema de colaboração.
Tal atitude, porém, foi se modificando, com a publicação do decreto (1º de fevereiro de 1808) que extinguia o Conselho da Regência e destituía a dinastia de Bragança. Novos impostos foram determinados, como a contribuição de guerra extraordinária, no valor de 100 milhões de francos. Foram ainda sequestrados os bens pertencentes à família real portuguesa, bem como os de todos os fidalgos que acompanharam D. João.
Em meados de junho, chegou a Lisboa a notícia do Manifesto ou exposição justificativa do procedimento da Corte de Portugal a respeito da França, escrito no Rio de Janeiro em 1º de maio, que proclamava fidelidade à aliança inglesa e que autorizava os súditos portugueses “a fazer a guerra por terra e mar aos vassalos do Imperador dos Franceses”. Era o início, ainda que simbólico, da ofensiva contra o invasor. Em agosto de 1808, a Restauração portuguesa começava, por meio de uma operação, decidida pelo próprio governo inglês, sem o acordo prévio de qualquer autoridade portuguesa. Dois fatores foram decisivos para a derrota das tropas francesas: a impossibilidade de apoio da Espanha, também convulsionada, e a fidelidade da massa popular a seu rei, colocando-se contra o invasor infiel. Em fins de setembro de 1808, Lisboa proclamava a Restauração completa do reino, em meio a festas e celebrações.
O ano de 1809 foi marcado pelo temor constante de novas invasões. Na visão dos próprios governadores do reino, “o insaciável Napoleão” não deixaria de empenhar todas as suas forças para vingar seus exércitos humilhados. A segunda invasão foi iniciada, em março de 1809. O terreno acidentado e o erro estratégico de subestimar a capacidade de mobilização da população da região, porém, garantiram o êxito da atuação do exército luso-britânico, forçando a expulsão dos franceses.
Em agosto de 1810, o exército francês entraria em Portugal novamente. Os franceses apoderaram-se de Coimbra, mas foram obrigados a recuar. Travou-se então prolongada guerra de usura, recorrendo os dois lados à tática de terra arrasada, o que provocou fome e devastação entre os portugueses, mas que também desgastou as tropas napoleônicas. Nessa situação, as tropas francesas começaram sua retirada, em março de 1811, embora só em outubro tenham atravessado a fronteira espanhola.
No Rio de Janeiro, D. João VI recompusera o Conselho da Regência em Portugal. Este prosseguiu na política de manter aceso o patriotismo dos habitantes e, se, em suas proclamações, louvavam o auxílio britânico, ressaltavam, contudo, que o grande mérito da vitória pertencia ao povo português, cuja lealdade e constância estiveram sempre presentes, apesar de tantos sofrimentos.
Publicado em 2009
Legenda : Bonaparte (Premier Consul). Hopwood. 1845