Exploradores franceses na Amazônia

Na segunda metade do século XIX, as expedições realizadas pelos exploradores Jules Crevaux (1847-1882), Henri Coudreau (1859-1899) e Jean Chaffanjon (1854-1913) contribuíram para a construção do conhecimento científico acerca da Amazônia. 

Financiados pelo governo francês e inseridos em uma lógica colonial, eles percorreram os confins da região amazônica, inventariando recursos capazes de suprir as necessidades das ciências naturais e sociais emergentes no período e também da Revolução Industrial, então em andamento. Os resultados de tais empreendimentos se manifestam em um conjunto de objetos etnográficos, dados cartográficos, publicações diversas e coleções iconográficas únicas sobre as sociedades e os lugares por onde estiveram.
 
As expedições de Jules Crevaux
 
Jules Crevaux comandou quatro expedições na Amazônia. Médico militar originário de Lorquin (Moselle), foi lotado na Guiana francesa, em 1874. Dois anos depois, encarregado pelo Ministère de l’Instruction publique de explorar o interior da colônia, dirigiu sua primeira expedição (1876-1877) na zona da serra do Tumucumaque, onde os primeiros viajantes espanhóis haviam situado o mítico Eldorado amazônico. Em sua segunda expedição (1878-1879), partiu de Caiena com destino aos Andes, subindo o rio Oiapoque. Na terceira expedição (1880-1881), navegou entre os rios Magdalena e Orinoco, e, por fim, na quarta (1881-1882), que lhe foi fatal, buscava explorar o rio Pilcomayo. As expedições de Crevaux renderam uma coleção de objetos etnográficos doados ao então Muséum ethnographique; uma importante contribuição à cartografia dos rios amazônicos – condensada na obra póstuma Les Fleuves de l’Amérique du Sud (1883); publicações variadas; fotografias e croquis utilizados em conferências, além de artigos publicados em importantes periódicos da época, como Le Tour du Monde e Journal de Voyages.
 
Henri Coudreau e a França equinocial
 
O sucesso das explorações de Jules Crevaux inspirou Henri Coudreau a embarcar rumo à Amazônia. Natural de Charente-Maritime, instalou-se na Guiana francesa como professor de História do Liceu de Caiena, em 1881. A partir desse período, iniciou por conta própria algumas incursões ao interior da Guiana, publicando, como resultado, o livro Les Richesses de la Guyane française, em 1883. Neste mesmo ano, foi enviado pelo Ministère de l’Instruction publique em missão oficial na zona do Contestado Franco-Brasileiro (1883-1885). Em seguida, outras missões sob comando do governo francês ocorreram (1887-1889, 1889-1891), até que o explorador se colocou a serviço dos Estados brasileiros do Amazonas e do Pará (1895-1899). Ainda que o objetivo oficial de suas expedições tenha sido a cartografia dos rios amazônicos, a questão do Contestado ocupou papel central em sua obra. Sonhando com a fundação de uma colônia agrícola, a França equinocial, o explorador se empenhou em atrair a atenção de seus compatriotas para o potencial natural e produtivo do lugar, dedicando boa parte de suas publicações e conferências a tal intuito. Cumpre lembrar que a expressão “França equinocial” foi inspirada na tentativa de colonização francesa ocorrida no norte do Brasil entre 1612 e 1615. Os numerosos relatos de viagem e artigos de Henri Coudreau, publicados em boletins da Société de géographie de Paris e da Société de géographie commerciale de Paris, foram ricamente ilustrados com imagens fotográficas e mapas da Amazônia.
 
Jean Chaffanjon e a nascente do Orinoco
 
Natural de Arnas, Jean Chaffanjon chegou na Martinica após ter sido nomeado professor de História Natural do liceu Saint-Pierre, em 1882. Pouco tempo depois, em 1884, obteve sua primeira missão pelo Ministère de l’Instruction publique: realizar estudos geográficos, etnográficos e de história natural na bacia do Orinoco. No ano seguinte, foi encarregado pelo mesmo ministério de encontrar a nascente do rio Orinoco – um empreendimento que já havia sido realizado, mas sem êxito, por outros exploradores. Ao final da missão, em 1887, o explorador acreditava ter logrado sucesso. Entretanto, a verdadeira nascente foi alcançada por Joseph Grellier, apenas em 1951. Após uma terceira missão na América do Sul (1889-1890), Chaffanjon passou a realizar explorações na Ásia central (1894-1896). Suas expedições lhe permitiram reunir um volumoso conjunto de objetos e amostras, enviado ao Muséum de Paris e ao Musée d’Ethnographie du Trocadéro, assim como uma rica coleção de fotografias, croquis e mapas e a obra L’Orenoque et le Caura (1889), que reúne seus relatos de viagem.
Os resultados das expedições de Jules Crevaux, Henri Coudreau e Jean Chaffanjon se tornaram um patrimônio valioso para os estudos que se versam sobre as representações da Amazônia sob o ponto de vista exógeno. Além disso, encorajaram outras expedições na região, como as do alemão Karl von den Steinen (1855-1929); inspiraram a ficção literária europeia, a exemplo dos romances de aventura La Jangada (1881) e Le superbe Orénoque (1898), escritos por Jules Verne; e também forneceram matéria para ensaios publicados pelos próprios homens de letras brasileiros, tal como a obra Le pays des Amazones, de Frederico José de Santa-Anna Nery (1848-1901).

 

Publicado em dezembro de 2022

 

Legenda : L'Orénoque et le Caura, Jean Chaffanjon, 1889

Réduire l'article ^