Dina Dreyfus no Brasil

A filósofa e antropóloga Dina Dreyfus, que participou das duas missões etnográficas coordenadas por Claude Lévi-Strauss entre povos indígenas do Brasil, permaneceu, até os anos 2000, uma figura pouco conhecida nas fontes brasileiras.

Explica-se pela brevidade de sua estadia, de 1935 a 1939, e ao fato de ter voltado a seu nome de solteira após a Segunda Guerra Mundial e o divórcio de Lévi-Strauss. Outro fator: deixou a antropologia para se dedicar à reflexão sobre o ensino da filosofia nas escolas francesas. Nas décadas seguintes, ficou lembrada nas memórias das primeiras turmas de bacharéis em ciências sociais em São Paulo, e de suas redes de colegas e alunos até os anos 1990.

A partir de 1936, Dina Dreyfus aparece nas fontes brasileiras como responsável por um curso de etnografia — primeira iniciativa de difusão cultural do Departamento de Cultura da Cidade de São Paulo, dirigido por Mário de Andrade. Sem o cargo de docente prometido, fosse no liceu francês, fosse na Universidade de São Paulo, ela aceita o convite do modernista. O curso tem como objetivo formar a equipe do Departamento para a produção de documentação etnográfica e folclórica e, possivelmente, criar um museu dedicado a essas temáticas. As atividades, abertas ao público, receberam também estudantes dos recém-criados cursos de Ciências Sociais da Escola de Sociologia e Política e da Universidade de São Paulo.

O nome Dina Lévi-Strauss surge então como realizadora de filmes etnográficos para o Departamento, produzidos durante a missão Lévi-Strauss no Mato Grosso ou na Festa do Divino em Mogi das Cruzes, como parte da formação do curso. Também é mencionado nos anúncios de suas aulas, ministradas na Escola de Comércio Álvares Penteado, publicados duas vezes por semana no Estado de S. Paulo, e em minutas da aula inaugural, que contou com a presença de Arthur Ramos, importante nome da antropologia brasileira da época.

Em 1937, Dina é nomeada secretária da Sociedade de Etnografia e Folclore (SEF), responsável por estruturar a metodologia de seus trabalhos, e autora do primeiro volume de orientações para coleta de dados em antropologia física — Instruções Práticas para Pesquisas de Antropologia Física e Cultural. Ela coordenou uma ampla coleta de informações folclóricas em todo o Estado de São Paulo, posteriormente apresentadas como mapas folclóricos no Congresso Internacional de Folclore em Paris.

As atividades formativas conduzidas por Dina Dreyfus nos primeiros anos das Ciências Sociais em São Paulo contribuíram de modo decisivo para os estudos de comunidade, estudos que marcaram a antropologia brasileira até o início dos anos 1950. Com a intervenção do Estado Novo nas atividades do Departamento de Cultura e a dissolução da Sociedade de Etnografia e Folclore, e com o deslocamento dos estudos de folclore da universidade para as políticas culturais, a memória da SEF também se apagou. A documentação da Sociedade, no entanto, foi preservada na Discoteca Pública Municipal, sob os cuidados de Oneyda Alvarenga, sua ex-aluna.

Com a redemocratização nos anos 1980 e 1990, e a redescoberta do Departamento de Cultura como referência para políticas culturais no Brasil, Dina Dreyfus reaparece como formadora de Luís Saia, coordenador da Missão de Pesquisas Folclóricas e técnico do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. O tratamento arquivístico da documentação da SEF, hoje sob guarda do Centro Cultural São Paulo, revelou a amplitude e a diversidade das pesquisas por ela orientadas.

Atualmente, com a biografia de Lévi-Strauss escrita por Emmanuelle Loyer e as pesquisas das antropólogas Luciana Portela e Fernanda Azeredo Moraes, é possível compreender melhor a articulação entre as fontes francesas e brasileiras e o papel de Dina Dreyfus na formação do Museu do Homem e na coordenação das Missões Lévi-Strauss ao Mato Grosso e à Serra do Norte. O público brasileiro pôde assim conhecer mais de perto o percurso posterior dessa figura marcante, sempre preocupada, como poucos na memória das ciências humanas, pela coerência entre pesquisa, difusão e formação de novos praticantes — e que marcou tanto a antropologia quanto a filosofia.

Publicado em Novembro de 2025

Legenda : Claude et Dina Lévi-Strauss, Brésil - Juin 1938 - Collection des archives du musée d'astronomie et des sciences connexes/MAST